sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Choque de cultura

As pessoas quando viajam ou vão morar em outros lugares, geralmente se deparam com as diferenças entre o modo como se vive naquele lugar novo que ela conhece. E eu como uma boa baiana que veio morar em São Paulo sou uma prova pulsante de como é um choque cultural você vir morar em um lugar com outros costumes e jeito de viver totalmente diferentes e, pior, muitas vezes desconhecidos. A Bahia também é um estado nordestino conhecido pelo litoral deslumbrante, pessoas morenas e queimadas de sol e um sotaque peculiar e cantante comum ao povo do nordeste. (Apesar de que sob o olhar de muitos e muitos paulistas e paulistanos, a Bahia é mais que isso, é um lugar de onde vêm pedreiros, porteiros, cozinheiros ou outras profissões discriminadas pelos nossos nobres hospedeiros dessa região cinza do Brasil ou ainda onde as pessoas só sabem dançar axé e cantar por vogais. Mas não vamos dar foco a isso, porque depois daquele pobre e lamentável comentário de uma twitteira paulistana, não há nada mais o que se comentar a respeito disso.)
Sob o olhar das pessoas que moram num lugar, aquele que chega é visto como o diferente. Seguindo esse raciocínio as pessoas que chegam nesse local estranho também vêem muitas diferenças em grande parte das coisas que acontecem no dia a dia dessas novas pessoas.
Pra ilustrar o que aqui estou a divagar, o primeiro dia que pisei nessa cidade imensa que é São Paulo, não conseguia me situar. Aos 19 anos viajei sozinha até aqui umas longas 28h e quando cheguei na marginal Tietê olhando pela janela no ônibus vi tantos e tantos carros, um céu de cor esquisita, um cheiro ruim e meu nariz reagiu de modo estranho ao ar sujo daqui. Uma grande irritação nasal e um desconforto ao respirar. Desde então minha rinite nunca mais foi dócil como antigamente. Quando desci do ônibus na rodoviária, avistei meu tio que fora me buscar. Arrastando a mala pelas rodinhas olhava em volta e tentava acompanhar ele subindo grandes escadas rolantes por onde desciam e subiam uma multidão de pessoas, indo e vindo. Nunca tinha visto tanta gente junta em toda a minha vida, a não ser nos shows musicais que eu já tinha ido. *Naquele dia entendi o sentido daquele poema de Drummond, sobre as pernas que ele via no bonde.*
Desde então, foram só descobertas e mais situações, antes desconhecidas, que encontrei vivendo nessa cidade. Sempre quando eu ia falar alguma coisa as pessoas riam por causa do meu sotaque e muitas vezes não entendiam o significado de palavras que eu falava. Eu também demorei pra entender algumas palavras que são usadas por aqui. Comer tapióca (beijú), tomar sorvete (picolé), bala de goma (jujuba) e outras mais. Além do meu sotaque outra coisa se desencontrava das pessoas daqui: os cumprimentos. Lá na Bahia as pessoas se cumprimentam com 1 beijo em cada lado do rosto: total de 2 beijos. Enquanto aqui se dá somente 1. Ou seja, eu fiquei por um bom tempo beijando o vento quando conhecia alguém. Andar de ônibus, eis uma odisséia. São milhares de destinos diferentes, ônibus gigantes acoplados um no outro, com botões para dar o sinal ao invés de cordinhas pra puxar, e o pior, muitas e muitas portas para entrar e sair, e ainda possibilidades de sair do lado direito e também do esquerdo. Que aventura andar de ônibus. Na minha cidade a gente não passava mais de 20 minutos para atravessar a cidade, aqui demora 2 horas e você nem atravessou um terço dela. DUAS HORAS !! Em 2 horas eu ia pra outra cidade "longe" da minha, a gente VIAJAVA em 2 horas!

* Na foto aqui ao lado: eu, recém-chegada, na av. Paulista em outubro de 2006, perto de um carro da F1 exposto na calçada.

Por um curto tempo eu comecei a fazer um cursinho pré vestibular. Curto tempo porque as mensalidades desse cursinho correspondiam ao valor da mensalidade de cursos de graduação (mesmo conseguindo um bom desconto) nas dezenas de faculdades que existem em São Paulo, o triplo do que custavam na minha antiga cidade baiana. Mas foi uma experiência muito boa, recebia verdadeiros livros claros e atuais, resumos e outros livros de determinadas áreas da disciplina, no meu antigo cursinho eram xerox e apostilas simples encadernadas. Na sala de aula os professores corrigiam os exercícios lá na frente em voz alta junto com a turma, e quando os alunos tentavam acertar a opção certa dizendo a letra em coro, eu nunca entendia se era b, c, d ou e, porque a sonoridade é muito parecida (bê, cê, dê e ê, imagine mais de 50 pessoas gritando todas essas letras misturado), e quando eu pedia emprestado a lapiseira (apontador), as minhas colegas me davam o grafite (lapiseira).
Quando comecei a fazer faculdade e na primeira semana a professora exigiu que sempre entrássemos nos laboratórios de avental, eu pensei: "meu Deus, avental ? Será que eu não tô na turma de odonto ? Será que ela é prof de nutrição ?" Depois descobri que o avental era o jaleco. Durante o curso, alguma colegas levavam lanche pra sala de aula porque vinham direto do trabalho e tal. O detalhe sobre o lanche era que algumas tiravam da bolsa mexericas (tangerinas) e bananas. Frutas que ninguém normal da Bahia come numa sala de aula... rsrs E nas ruas daqui as pessoas não usam short's (short na Bahia, sem o "s"), nem saias, nem vestidos. As pessoas daqui só usam calças, mesmo no calor. E no frio, um certo dia uma amiga paulistana me perguntou: "você veio sem blusa?", eu pensei bem antes de responder, porque eu tava vestindo uma blusinha de manga longa, inclusive. Será que eu estava vestindo uma roupa inadequada ou fora de moda? Depois eu entendi que "blusa" se refere a casaco, roupa de frio. Minhas roupas de frio que eu tinha até chegar aqui eram jaquetas jeans simples, blusas de manga longa, blazers básicos e CALÇAS JEANS. E algumas pessoas vestiam roupas de gosto duvidoso, alguns homens usavam bermuda com tênis e a meia quase próximo do joelho, bem esticada, mulheres com calças de cós alto, bota por cima da calça.. sei lá, na época era fora de moda tudo isso. Percebi que as pessoas não sorriem pra ninguém e não cumprimentam em ambientes familiares ou no elevador, são esquivas e distantes. De onde eu vim as pessoas acenavam, sorriam ou diziam Oi! "descompromissadamente", sem se passar por "piriguete" mas sendo simpático e educado mesmo. E os shoppings ? Tantos e enormes. E as ruas? Imensas e lotadas de gente.
E quase todo mundo dessa cidade tem um carro. Não é privilégio de profissões nobres ou pessoas com bom poder aquisitivo. Aqui recepcionistas, flanelinhas, advogados, médicos e padeiros, todos têm carro, sem discriminação.
Tantos contrastes.
O engraçado é que para a maioria do povo de São Paulo, tirar fotos nas ruas esburacadas e velhas do Pelourinho é turismo, e pra ir à praia necessita reservar dinheiro ou planejar férias.
Na minha terra, pra ir à praia é só dar na telha, convidar um amigo 1 dia antes e questão de alguns minutos.
São muitas e muitas diferenças.
É um choque cultural, de verdade.

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